Quantidade e qualidade são os principais desafios que o Brasil deve
enfrentar nos próximos anos quando o assunto é a formação de
engenheiros. Com altas estimativas de demanda e pouca oferta de mão de
obra qualificada, muitas instituições de ensino já apostam na criação de
cursos para esses profissionais. Agora, é a vez de organizações sem
fins lucrativos como o Instituto de Engenharia e o Sindicato dos
Engenheiros de São Paulo também investirem na formação da área.
De acordo com um estudo publicado pelo Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea), o Brasil precisará formar, até 2020, 95 mil
engenheiros por ano para sustentar um crescimento econômico anual por
volta dos 4% (uma expansão de 2,5% exigiria mais de 70 mil engenheiros
por ano). Pelo mais recente levantamento da Associação Brasileira de
Ensino de Engenharia (Abenge), o número de formandos na área em 2010 foi
de 41 mil.
O déficit de engenheiros, no entanto, não é o único dado que se
destaca no levantamento. Ainda segundo o Ipea, menos de 30% dos formados
em engenharia em 2008 saíram de universidades consideradas de alto
desempenho, com conceito 4 ou 5 no Ministério da Educação (MEC). A maior
parte dos graduados (42%) formou-se em instituições com conceito 1 ou
2.
Especialistas concordam que a graduação em engenharia, mesmo nas
escolas mais renomadas, ainda não oferece o tipo de conhecimento de
gestão e negócios que o mercado exige hoje. “Existe uma diferença entre o
que as empresas precisam e o que a universidade ensina”, diz Denise
Retamal, diretora executiva da consultoria de recrutamento Rhio’s,
especializada nas indústrias de mineração, petróleo & gás, energia,
construção civil, engenharia e infraestrutura. Para a consultora, o que
mais falta atualmente são profissionais que aliem conhecimento em uma
especialidade e experiência no mercado, além de visão estratégica de
negócios e idiomas estrangeiros.
Para Vanderli Fava de Oliveira, diretor de comunicação da Abenge, só
agora os cursos de engenharia estão começando a perceber a necessidade
de transmitir aos profissionais habilidades relacionadas à gestão. “As
escolas estão verificando que, além de formar a base tecnológica,
precisam também ensinar a gerir essa tecnologia”, explica.
De acordo com Oliveira, a velocidade com que as técnicas ficam
obsoletas cria não só a necessidade de se manter atualizado
constantemente, mas torna fundamental saber administrar a tecnologia – e
não apenas usá-la. “O que falta é negócio, é como ganhar dinheiro com
engenharia”, simplifica Hélio Guerra, presidente da Fundação para o
Desenvolvimento Tecnológico da Engenharia (FDTE) e ex-reitor da
Universidade de São Paulo (USP).
Dessa demanda surgiu a Escola Superior de Negócios em Engenharia
(Esne), fruto de uma parceria do Instituto de Engenharia, organização
sem fins lucrativos fundada em São Paulo em 1916, e a FDTE, organização
criada por Guerra e um grupo de professores da Escola Politécnica da USP
nos anos 1970. Com aulas iniciadas em agosto, a escola oferece cursos
de extensão em negócios públicos e privados em engenharia. Os temas
abordados incluem gestão de projetos, legislação, finanças e análise de
risco. “São assuntos que não são vistos na graduação”, diz Guerra. Os
programas são voltados para engenheiros que já possuem experiência e
buscam se capacitar para assumir cargos de liderança, além de
profissionais de outras áreas que participem de projetos.
Já o Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo (Seesp)
resolveu focar na graduação para lidar com os desafios de qualidade na
formação em engenharia. No fim de 2009, começou a desenvolver o projeto
do Instituto Superior de Inovação e Tecnologia (Isitec), fundado no ano
passado. Com sede em São Paulo, começa neste semestre a promover cursos
de extensão em áreas específicas como propriedade intelectual e gestão
ambiental. Mas o grande projeto virá no ano que vem, quando a
instituição começará a oferecer um curso de graduação em engenharia da
inovação. “Vimos que a necessidade de profissionais que podem contribuir
para o desenvolvimento de inovação de produto e de processo seria um
gargalo para qualquer projeto de desenvolvimento do país”, diz Antonio
Octaviano, diretor-geral do instituto.
O curso pretende ter uma base mais generalista do que os outros
cursos de engenharia. “O profissional precisa ter um perfil diferente
tanto do que tínhamos antes quanto do que ainda formamos, que é o do
engenheiro ultraespecializado”, explica.
Com a intenção de desenvolver uma relação permanente com o mercado, o
currículo do curso se concentra em gestão, abrange áreas como a
comunicação e quer promover a participação de professores visitantes de
outros países. A decisão de focar a atuação do instituto na graduação
veio da necessidade de formar um profissional mais flexível, capaz de
transitar entre diferentes áreas – demanda que os idealizadores viram no
mercado. “A evolução técnica é muito intensa. É preciso ter a
competência para transitar em diferentes áreas com mesma qualidade.”
Fonte: Valor Econômico
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