Durante evento realizado em São Paulo, executivos
de grandes empresas afirmaram que a mão de obra é a principal carência para
setores em desenvolvimento no Brasil. Em uma lista de seis itens de
"preocupações imediatas" - demanda fraca, mão de obra, inflação, câmbio, custo
do crédito e inadimplência dos clientes - a disponibilidade, o custo de pessoal
e sua qualificação receberam as notas máximas (de oito a dez), seja na
indústria, no varejo ou em serviços. A nota para essa preocupação ficou acima da
inflação, revertendo inquietações de 2011. No ano passado, no mesmo evento,
executivos relataram que "velhas" preocupações com aumento de custos de insumos
haviam retornado para sua agenda.
Demanda fraca e câmbio também apareceram como fortes preocupações de curto
prazo. Para esses itens, os temores foram mais fortes entre as companhias muito
ligadas ao comércio exterior, mas também apareceram entre diferentes produtores
de bens de consumo, como automóveis, vestuário e bebidas.
O presidente da CPFL, Wilson Ferreira Júnior, explica que não há "uma
preocupação somente com qualificação, mas também com disponibilidade de mão de
obra. A disputa por funcionários acaba inflacionando os salários e, em alguns
casos, as opções de contratação são muito poucas", diz o executivo. Renato Alves
Vale, presidente da CCR, acrescenta à disponibilidade outra preocupação: a
formação. "Nossa preocupação é ter pessoal preparado para garantir sucesso em um
ambiente de crescimento, com aumento de demanda." Essa preparação, salienta,
também envolve a capacidade de gerar lideranças para guiar a empresa.
"A formação de mão de obra no médio prazo é o principal motivo de preocupação
para a Totvs, afirma Laércio Cosentino, executivo-chefe da maior companhia de
software de capital nacional. "O setor de tecnologia da informação demanda mão
de obra em larga escala e a velocidade da formação de técnicos nos próximos anos
será inferior à necessidade das empresas", diz Cosentino. Para ele, demanda
fraca, crédito, inflação, inadimplência dos clientes e câmbio mereceram notas
muito baixas - de dois a três.
A mão de obra também está entre as maiores preocupações da farmacêutica
francesa Sanofi-Aventis, controladora do laboratório Medley, maior de genéricos
do Brasil, presidida no país por Heraldo Marchezini. Esse item recebeu nota
oito. Na petroquímica Braskem, o projeto de crescimento e internacionalização
fez a mão de obra subir ao topo dos temores. Carlos Fadigas, presidente da
companhia, diz que esse fator já seria crítico em qualquer circunstância. "Como
vivemos uma época de pleno emprego, a disputa natural entre as empresas pelos
melhores talentos do mercado torna-se mais acirrada e pressiona os salários para
cima, o que torna a questão dos recursos humanos ainda mais relevante", diz ele.
Por isso, o executivo sugere que o governo siga desonerando o custo da mão de
obra.
Fabio Schvartsman, diretor-geral da Klabin, acrescenta demanda fraca e
inadimplência à preocupação com mão de obra. Schvartsman diz que o conjunto de
medidas tomadas pelo governo para fortalecimento da economia, seja de incentivo
às indústrias, sejam as ações da política monetária de redução de juros, ainda
não se traduziram em recuperação importante na economia. Outro setor, bem
diferente, tem preocupação semelhante. A demanda fraca e o custo do crédito são
as maiores preocupações para Jayme Garfynkel, presidente da Porto Seguro. Quanto
ao custo do crédito, seu maior temor recai sobre o financiamento de veículos,
que, segundo ele, já afeta o mercado de seguros.
Já para o presidente do grupo São Martinho, Fábio Venturelli, o câmbio está
no topo das preocupações. A estabilidade do moeda, diz ele, é essencial para as
atividades da companhia por conta de seu "expressivo volume de exportações". Em
um segmento com características semelhantes, o presidente da BRF - Brasil Foods,
José Antonio do Prado Fay, também relacionou a mão de obra como principal
preocupação. "Trabalhamos em um setor em que a mão de obra é muito intensiva e
temos dificuldade para contratar", disse ele, citando os cerca de 2 mil postos
de trabalho abertos que a BRF não conseguiu preencher.
Ainda no agronegócio, o presidente da JBS, Wesley Batista, também elencou mão
de obra como sua principal inquietação. "Para fazer frente ao crescimento do
Brasil, precisamos de mão de obra qualificada", sendo necessário maior
"investimento em educação".
Em outro setor, e procurando outro perfil de profissional, o presidente da
operadora de telefonia Telefônica/Vivo, Antônio Carlos Valente, fez coro aos
empresários do agronegócio. "Trata-se de um tema que, devido ao desempenho
econômico dos anos recentes, pode trazer algumas dificuldades para companhias
dos mais variados segmentos, em especial para aquelas com alto nível de
especialização como o nosso", diz Valente. Ainda no setor de serviços, a
retenção dos empregados é uma preocupação. O presidente do Cinemark, Marcelo
Bertini, diz que a empresa trabalha muito com primeiro emprego e salário mínimo,
onde o mercado é muito competitivo, dificultando a manutenção dos funcionários
na empresa.
Câmbio, mão de obra, demanda fraca e inadimplência ocupam, cada um, a mesma
nota de preocupação do presidente da Fiat, Cledorvino Belini. Marcando oito para
cada um desses itens, ele aposta que a redução dos juros trará uma reversão do
quadro de retração que marcou o primeiro trimestre.
A demanda também está entre as preocupações de outro setor ligado ao consumo.
Apesar dos bons resultados da companhia nos últimos trimestres, o presidente da
Hering, Fabio Hering, nota desaceleração da demanda. "Não sei se esse movimento
está relacionado com o endividamento grande, principalmente da classe média.
Porque a gente não vê nada em termos de emprego e renda", observa o
executivo.
A dificuldade em entender o que está acontecendo com a demanda é partilhada
pelo presidente da Ambev, João Castro Neves. Ele disse que a demanda é uma
preocupação "importante" da companhia. Ele diz que o segmento em que a companhia
atua passou por forte crescimento em 2009 e 2010, e desde 2011 está vivendo um
processo de desaceleração. No primeiro trimestre do ano, o volume de vendas da
companhia cresceu, mas por conta de ganho de participação de mercado, e não por
conta da expansão do segmento. "A preocupação com essa retração ou
desaceleração, como se queira chamar, não está restrita ao nosso setor nem à
nossa companhia, mas ao mercado como um todo".
Mostrando que as preocupações de curto prazo são as mesmas que marcam uma
visão de longo prazo, a questão tributária, um tema que vem atormentando a
companhia nos últimos meses, é a principal preocupação do presidente da Vale,
Murilo Ferreira. "Isso gera uma incerteza na precificação das ações da empresa e
causa receio para os investidores e para a companhia", afirmou. A essa questão
ele atribuiu nota oito. Em seguida, ele elenca a mão de obra (sete) e o
câmbio.
Ferreira não ficou sozinho. O que mais preocupa Alessandro Carlucci,
presidente da empresa de venda direta de cosméticos Natura, neste momento, é o
"arcabouço tributário do Brasil", que, segundo ele, dificulta o planejamento das
empresas. Entre os itens levantados pelo Valor, a dificuldade de mão de obra
está entre os assuntos que mais afligem o executivo, que atribui um grau de
preocupação entre cinco e seis ao tema. "A busca por talentos vai ficar cada vez
mais desafiadora, porque a capacidade do Brasil de desenvolver pessoas não é na
mesma velocidade com a qual a economia cresce", diz.